Interpretação Bíblica
Evangelho de João 18
João 18
Os Sofrimentos e a Glória.
18:1 – 20:31. João 18 A. A Traição. 18:1-14.
A narrativa de João enfatiza a firmeza de Jesus e Sua prontidão em ser
levado, tornando inútil a traição de Judas de um lado e a tentativa de Pedro
exibir sua lealdade doutro lado. Aqui está incluída a narrativa da prisão e da
transferência de Jesus para a casa do sumo sacerdote.
1. Depois da oração, Jesus levou seus discípulos para o outro lado do
ribeiro de Cedrom. A palavra ribeiro indica uma
corrente que mana no inverno. O destino era um jardim que ficava no lado
oriental. Mateus e Marcos dão o nome de Getsêmani. João não diz nada sobre a
agonia no jardim, embora mostre ter conhecimento da luta em oração que teve o
jardim por cenário (cons. v. 11). Não sabemos porque omitiu este incidente.
Talvez estivesse tentando destacar o elemento da confiança na atitude de Jesus,
a qual já foi expressa na oração (17:4) e agora passa a ser demonstrada em sua
paciência e atitudes.
2. Muitas vezes (Lc. 22:39). Talvez Jesus e Seu grupo
costumasse passar a noite ali (Lc. 21:37). Por isso Judas sabia onde devia
procurar o Senhor naquela noite.
3. Judas também entrou com um grupo no jardim mas que contraste!
A escolta (gr. speira) indica um grupo de cerca de
seiscentos homens, mas não quer dizer que estivessem todos presentes nesta
ocasião. Estavam alojados no Castelo de Antônia, ao norte da área do templo
(cons. Atos 21:31 e segs.) Ao que parece as autoridades judias tinham o direito
de convocar esses soldados para ajudá-los em qualquer emergência que ameaçasse
o interesse público. A cidade estava cheia de peregrinos que iam assistir a
festa, muitos dos quais simpatizava com Jesus e poderiam causar problemas se
estivessem por perto quando Ele fosse preso. Guardas. Era a guarda
do templo que estava a serviço dos líderes judeus (cons. Atos 5:22). Levavam
luzes para procurar sua presa e carregavam armas para derribar qualquer
resistência que surgisse.
4. Sabendo... todas as cousas. Este é um forte traço joanino na
apresentação de Cristo, e destaca-se especialmente em relação aos
acontecimentos da Paixão (cons. 13:1, 3). Nada tomou nosso Senhor de
surpresa. Adiantou-se. Cons. 18:1 e a muitas vezes repetida
ênfase dada à saída do Filho, vindo do Pai para o mundo, mais relativa àquela
ocasião, 16:28 por exemplo. A quem buscais? A pergunta serviu
para pôr o grupo que se aproximava em defensiva momentânea, obrigando-o a
declarar que seu único objetivo era Jesus. Isto tornou mais fácil pedir que os
discípulos tivessem permissão de seguir o seu caminho.
5. Respondendo, Jesus, o Nazareno, a multidão indicou que
não o reconhecia, por causa da obscuridade e a distância em que se
encontravam. Sou eu. Literalmente, Eu sou. Esta
afirmação pode indicar simples identificação, como em 9:9, ou pode também dar a
entender o misterioso e majestoso nome do próprio Deus (8:58). Talvez ambos os
elementos estivessem fundidos neste caso. E Judas... estava também com
eles. Finalmente Ele se encontrava em seu próprio elemento,
misturando-se com os inimigos de Jesus.
6. Aqui não há nada de milagroso. O comportamento de Jesus, mais o
fato de que avançou na direção deles em vez de procurar fugir, deixou Seus
capturadores nervosos. Lembre-se de que alguns desses homens não foram capazes
de agarrá-lO anteriormente (7:45, 46). Sem dúvida a majestade de seu último
pronunciamento teve algo a ver com Sua reação também.
7-9. Quando a multidão confessou novamente que o seu objetivo era Jesus de
Nazaré, Ele pôde logo pedir que os discípulos tivessem permissão de partir. A
segurança física deles nessa ocasião pode ser considerada como uma prova de que
a sua preservação espiritual estava assegurada (cons. 6:39; 17:12).
10, 11. A atitude de Pedro em recorrer ao uso da espada é compreensível à vista
de sua declaração de lealdade em Jo. 13:37. A posse da espada explica-se pelo
conselho de Cristo em Lc. 22:35-38. A espada era um símbolo dos dias de luta
que estavam à frente, mas não era destinada ao uso literal. Eis aí o porquê da
repreensão de Jesus. O fato de João mencionar o nome do servo e especificar a
orelha é uma indicação de que foi testemunha ocular. Malco não era um dos
oficiais mas um escravo pessoal do sumo sacerdote.
12-14. Prenderam. Com o próprio Jesus pedindo que não
resistissem o grupo de soldados, levados por seu capitão (comandante) e
auxiliados pelos oficiais judeus, prenderam Jesus e o maniataram.
Não queriam se arriscar a qualquer deslize em seus planos. Os sinóticos falam
de Jesus aparecendo diante de Caifás, mas nada dizem sobre Anás neste
caso. Primeiramente chama a atenção do leitor para o material
que agora está sendo acrescentado à narrativa dos sinóticos. Embora Caifás o
genro de Anás, fosse o sumo sacerdote naquela ocasião, o próprio Anás estava
longe de se conservar inativo. Além de Caifás, Anás tinha diversos filhos que o
sucederam neste cargo, dando a esta família um monopólio do sumo sacerdócio por
mais de meio século. Lucas é o único escritor que menciona Anás (Lc. 3:2; Atos
4:6). Fontes judias deram ao regime de Anás o rótulo de corrupto. A
opinião de Caifás sobre Jesus já fora dada ao Sinédrio (11:49, 50).
B. Jesus Julgado diante dos Judeus. 18:15-27.
15. Incitado por sua declaração de lealdade ao Mestre, na presença dos
discípulos, Pedro seguiu Jesus. Outro discípulo. Esta figura
anônima pode ser o próprio João. Conhecido do sumo sacerdote. A
palavra conhecido encontra-se outras vezes em Lc. 2:44; 23:49.
Esta ligação que pode ser buscada, muito provavelmente, através de sua mãe e
respectiva família, capacitou João de obter a admissão de Pedro no pátio
interno.
17. A moça que trabalhava como porteira desafiou-o a se identificar,
provavelmente deduzindo que Pedro tinha ligação com Jesus, pois sabia que João
tinha, mas obteve uma negativa.
18. Agora Pedro deparou com os capturadores de Jesus, aquecendo-se diante de
um fogo no pátio. João interrompe a história da negativa de Pedro a fim de
contar o que estava acontecendo lá dentro onde Jesus estava sendo
examinado.
19, 20. Então, o sumo sacerdote interrogou Jesus. Ao que parece é
Anás. Não era um julgamento, pois o Sinédrio não fora convocado; antes era um
interrogatório para se obter evidências a serem apresentadas a este organismo
quando se reunisse horas depois. O interrogatório tocou nos discípulos e doutrina de
Jesus. Não se sabe se Anás tinha em mente processar os discípulos. É mais
provável que estivesse esperando obter uma confissão de que esses homens
estavam sendo preparados para uma atividade revolucionária. Jesus ignorou a
pergunta. No que dizia respeito aos Seus ensinamentos, negou ter dado
instruções secretas que pudessem ser interpretadas como conspiração
contra as autoridades. Ele ensinara francamente, em lugares
públicos tais como as sinagogas e o templo. Seus
ensinamentos não eram subversivos.
21. Por que me interrogas? Jesus deu a entender que o processo
era ilegal. Não havia testemunhas. Ele estava sendo levado a implicar-se com o
Seu testemunho.
22. Um dos guardas que estavam ali (outros ficaram no
pátio) achou que a resposta era imprudente e esbofeteou Jesus para
torná-lo mais dócil em sua atitude para com o sumo sacerdote.
23, 24. Quando Cristo apontou a injustiça envolvida, nem o criado nem Anás
puderam justificar tal atitude. Não havia nada a fazer além de enviar o
prisioneiro a Caifás. 25-
27. A narrativa retorna a Pedro. Enquanto Cristo estava negando as
insinuações apontadas contra Ele – e o fazia com justiça, Pedro negava o seu
Senhor, pecando. As duas perguntas feitas a Pedro foram bastante diferentes. A
primeira foi insinuante, como se esperassem que negasse o seu relacionamento
com Jesus; enquanto que a segunda levou o a se definir, a própria pergunta
implicando em sua culpa. Foi reconhecido como aquele que empunhara a espada no
jardim. O cantar do galo lembrou Pedro da predição do Senhor (13:38) e
provou-lhe o seu pecado. “Cantar do galo “ era o nome que se dava à
terceira das quatro vigílias nas quais a noite era dividida.
C. A Penosa Experiência Diante de Pilatos.
18:28 – 19:16.
28. Nada se diz a respeito do que aconteceu na casa de Caifás. Presume-se
que os leitores estejam familiarizados com a tradição sinótica das deliberações
tomadas no meio da noite e da sentença formal decretada pelo concilio de manhã
cedo. O pretório (gr. praitôrion, uma tradução do latim, praetorium,
o quartel-general do governador). Veja a discussão em 19:13. Poderem
comer a páscoa. Os líderes judeus, para ficarem cerimonialmente limpos,
não podiam entrar nos alojamentos dos pagãos. Estavam mais preocupados com a
purificação ritual do que no cumprimento da justiça. Estavam sedentos de
sangue.
29, 30. O Sinédrio não preparou uma acusação formal contra Jesus para apresentar
a Pilatos. Esperavam que o governador aceitasse a sua palavra sem discutir a
acusação de que este homem era um malfeitor. A resposta foi petulante. Os
judeus não gostavam de Pilatos. gar-o seg que a própria
imprecisão da declaração dos líderes judeus indicava que o caso não lhe dizia
respeito (cons. Atos 18:14). A nós não nos é licito matar
ninguém. Tudo o que os judeus queriam era um veredito de morte, que a
autoridade do governador encobrisse suas próprias decisões contra Jesus. A
perda do direito de infligir a pena de morte fazia os judeus tomarem
consciência de que eram um povo subjugado. Havia exceções, como no caso de uma
pessoa, mesmo um romano, que traspassava a barreira que separa o Pátio dos
Gentios da parte interior da área do templo. A morte de Estêvão parece
contradizer a declaração de João, mas deve ter se baseado no conhecimento que
os judeus tinham de que o governador não interferiria no caso.
32. Jesus predisse que morreria por crucificação, um método romano de
castigo, enquanto que os judeus usavam pedras (cons. Mt. 20:19). 33. Então
Pilatos tomou o caso em suas próprias mãos, interrogando Jesus no Pretório.
Parece que João supõe que seus leitores conhecem as narrativas dos Sinóticos,
as quais incluem uma acusação dos judeus contra Jesus dizendo que Ele se
declarara o rei da nação. Pilatos foi obrigado a examinar esse assunto com base
em possível intentona revolucionária. És tu o Rei dos judeus? O
pronome tu é enfático, como se Pilatos estivesse surpreso que
a aparência e atitude de Jesus tão pouco se adaptasse às pretensões de um rei.
O prisioneiro parecia inofensivo.
34. Antes de responder a pergunta, Jesus precisava saber se ela vinha do
próprio Pilatos na qualidade de um oficial romano ou se fora simplesmente
passada adiante como um boato. Talvez o sumo sacerdote tivesse discutido o caso
com Pilatos quando este solicitou os soldados romanos para ajudá-lo a prender
Jesus.
35. Pilatos, não querendo ser apanhando numa confissão de que tinha algo a
ver com a situação, jogou a responsabilidade sobre os judeus. A tua
própria gente. Dificilmente Pilatos poderia ter sentido o fato
sugerido por suas palavras (cons. 1:11).
36. O meu reino não é deste mundo. “Ele não
disse que este mundo não está na esfera de Sua autoridade, mas que a Sua
autoridade não tem origem humana “ (Hoskyns). Ele não era uma ameaça à
autoridade romana. No Seu reino não havia lugar para o uso da força.
37. Pilatos ficou perplexo. Aí estava um homem que tinha falado no seu reino
três vezes em rápida sucessão, mas não tinha nenhum sinal externo de
realeza. Logo tu és rei? Pilatos dificilmente creria que
alguém pudesse tomar por rei a figura que estava diante dele. Tu dizes
que sou rei. Jesus hesitava em afirmar que era rei, para que Pilatos
não entendesse mal a natureza do seu reino, o qual Ele agora explicou em termos
de verdade. Cristo viera para testemunhar dele. Ouve a
minha voz (cons. 10:3, 16).
38. Pilatos viu que Jesus não se interessava em política ou negócios de
estado e estava longe de ter um espírito belicoso, por isso encerrou a
entrevista, comentando um tanto desdenhoso, ao que parece, Que é a verdade? Ele
não era filósofo nem um homem religioso, mas um homem de ação. Satisfeito em
ver que o prisioneiro não apresentava perigo a Roma, informou disso os judeus
que esperavam do lado de fora. Não acho nele crime algum. Ele
não se referia à ausência de pecado, mas à inocência diante das coisas pelas
quais os judeus o acusavam.
39. Sentindo a tenacidade dos líderes em seu desejo de obter uma condenação,
Pilatos pensou ter achado um meio de contornar a situação e preservar a justiça
soltando o prisioneiro. Era costume por ocasião da Páscoa o governador agradar
a multidão soltando um prisioneiro escolhido por eles. Pilatos pensava que,
sendo Jesus muito popular, o povo, que já se ajuntara a esta altura para o seu
pedido anual, pediria a sua libertação.
40. Novamente João pressupõe um conhecimento da narrativa dos Sinóticos, referindo-se a Barrabás. Salteador. Bandido (cons. At. 3:14).
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